Kornberg e Goulian tiveram êxito em transferir da célula viva para o “tubo de ensaio” as substâncias necessárias para a reprodução de DNA de vírus. Os cientistas reconhecem o acontecimento não como a criação de um organismo vivo, mas sim como o estabelecimento de um gabarito para possibilitar a cópia do próprio DNA num tubo de ensaio, mediante um processo reprodutivo que ocorre normalmente apenas no interior de uma célula de microorganismo. Esse processo e os procedimentos experimentais utilizados são descritos detalhadamente. Até o presente, as mais próximas tentativas de “criar a vida” limitaram-se ao estabelecimento de condições adequadas nas quais os polinucleotídeos DNA ou RNA, obtidos de vírus ou existentes em células vivas puderam manifestar as suas potencialidades.
Introdução
Enquanto se discutia o primeiro transplante de coração humano, em meados de dezembro de 1967, a imprensa divulgou a eletrizante notícia de que havia sido criada vida num tubo de ensaio. Em discurso pronunciado na noite anterior, o Presidente Johnson havia feito a afirmação de que estávamos prestes a receber uma das “mais importantes notícias jamais lidas”.
Relatos nos noticiários populares precederam de algumas semanas o relatório científico formal. Apesar de alguns dos primeiros artigos possuírem um caráter sensacionalista – especialmente na grande imprensa – no seu todo eram eles notavelmente precisos, provavelmente porque os próprios cientistas convocaram uma entrevista coletiva para esclarecer o que havia acontecido.
Na entrevista coletiva, o detentor do prêmio Nobel, Arthur Kornberg, atualmente na Escola de Medicina da Universidade de Stanford, na Califórnia, o seu associado, Mehran Goulian, pesquisador realizando pós-doutoramento em Stanford, explicaram a pesquisa feita em cooperação com Robert L. Sinsheimer, do Instituto de Tecnologia da Califórnia.
Essencialmente a notícia dizia que havia sido sintetizado em laboratório o DNA de vírus (ácido desoxirribonucleico), biologicamente ativo. Na realidade eles não obtiveram DNA de vírus a partir de somente substâncias mais simples não procedentes de vírus, pois, como será visto em seguida, o DNA de vírus constituía uma parte essencial de sua mistura reagente. Ao invés disso, o seu êxito foi em transferir as substâncias necessárias para a reprodução do DNA de vírus, da célula viva para o tubo de ensaio.
Esse avanço científico é considerado como tendo grande importância, porque o DNA constitui os genes, ou seja, o material hereditário que dá às coisas vivas as características transmitidas de geração a geração. O DNA é característico de todos os organismos, com exceção de certos vírus cujos genes consistem de RNA (ácido ribonucléico). Dois anos antes, Sol Spiegelman e colaboradores haviam realizado uma síntese análoga a partir de RNA, na Universidade de Illinois; desta maneira, este trabalho mais recente, que fez uso do DNA de vírus, de certa maneira foi uma extensão daqueles resultados anteriores.
Fatores importantes na pesquisa do DNA
Kornberg esteve ligado ativamente à pesquisa molecular no setor da síntese do DNA por mais de uma década. Em 1959 recebeu ele o prêmio Nobel de Fisiologia e Medicina, pela descoberta da polimerase do DNA, uma enzima que catalisa a produção do DNA. Para a ocorrência dessa produção deveria haver um gabarito ou modelo de DNA, uma fonte de energia, e os necessários blocos de construção (precursores nucleotídeos). Entretanto, o polinucleotídeo (DNA) resultante não exibia atividade biológica como a molécula original do gabarito.
O sucesso decorrente da produção de moléculas de DNA que manifestariam atividade biológica reprodutiva, baseia-se em diversos fatores de importância: (1) a purificação da polimerase do DNA; (2) a escolha de um gabarito de DNA ideal; e (3) a utilização de uma nova enzima de união dos polinucleotídeos.
A polimerase do DNA utilizada pela equipe de Kornberg nas primeiras experiências, continha enzimas contaminantes (nucleases). Depois que era produzido o DNA sintético em misturas de incubação contendo a polimerase, as enzimas contaminantes causavam rompimentos no DNA recém-formado. Desta maneira, a atividade reprodutiva do DNA era destruída. Quando as nucleases de degradação foram removidas da mistura, a polimerase purificada levou à produção de DNA capaz de reprodução.
Organização do DNA
Não se conhece bem ainda a maneira exata pela qual o DNA é organizado e controlado nos cromossomos das células animais e vegetais. Entretanto, pesquisas indicaram que o DNA no núcleo da célula atua como um gabarito para a produção de RNA, o qual se desloca do núcleo para a região circundante da célula (citoplasma). Aí o RNA opera com os ribossomos e dita a conformação de várias proteínas, inclusive enzimas que são essenciais para a vida da célula e do organismo ao qual pertence à célula.
O tipo de DNA amplamente descoberto em vários animais, plantas e células humanas, consiste de dois filamentos enrolados um sobre o outro, de maneira a formar uma estrutura helicoidal. O DNA assemelha-se a uma escada que tenha sido torcida de tal maneira que as suas laterais fiquem espiraladas. Os filamentos são unidos entre si na região dos degraus da escada mediante ligações de Hidrogênio. Cada filamento é chamado de polímero (poly- muito; meros – partes) porque é composto de muitas unidades estruturais que se repetem. Cada uma dessas unidades é um nucleotídeo e por isso cada filamento polimerizado de DNA popularmente é chamado de polinucleotídeo.
O DNA contém quatro tipos de nucleotídeos. Todos os quatro contêm um grupo fosfórico, açúcar e uma base. A diferença entre eles reside nas bases, as quais são chamadas de adenina, timina, citosina e guanina.
As estruturas dos polinucleotídeos foram determinadas por métodos físicos e químicos, por serem eles muito pequenos para serem visíveis. Foi utilizado o microscópio eletrônico para fotografar os filamentos de DNA, mas a seqüência dos nucleotídeos não pôde assim ser revelada. A largura de uma hélice de DNA é de milimícrons, o que exigiria mais de 12 milhões dessas hélices lado a lado para totalizar uma polegada.
DNA e proteínas
Além do funcionamento como gabarito para a produção de RNA, o que leva à formação de proteínas vitais, o DNA constitui um molde para a sua própria reprodução em instantes apropriados. Quando isso acontece, os dois filamentos polinucleotídeos se separam. A seqüência linear das bases em cada filamento determinará quais os nucleotídeos que serão necessários para reconstruir a condição de duplo filamento. Onde houver uma base adenina, haverá a aproximação de uma unidade contendo timina, de maneira a juntar a timina com a adenina. Onde o filamento do gabarito contiver timina, juntar-se-á uma unidade de adenina.
Ao se completar a reprodução, a adenina (A) juntar-se-á à timina (T) e a citosina (C) à guanina (G) (Ver Figura 1). Essas combinações específicas constituem um alfabeto genético de quatro letras, formando os grupos A-T, T-A, C-G e G-C. A seqüência dessas “letras” distingue genotipicamente um organismo de todos os demais. As proteínas serão construídas de acordo com “ordens” dadas pelo arranjo das letras.
As proteínas são compostas de unidades conhecidas como aminoácidos, variando em tamanho desde cerca de 50 até 3000 aminoácidos. É necessário uma seqüência de três nucleotídeos para determinar um aminoácido. Para a produção de uma cadeia relativamente pequena de 150 aminoácidos, seria necessária uma seqüência de 450 nucleotídeos.
Essa seqüência constituiria o que popularmente é chamado de gene. É necessário que a seqüência dos nucleotídeos seja preservada exatamente, para que sejam produzidas as proteínas corretas para a manutenção da espécie de vida que é característica de cada organismo.
Cada nucleotídeo é composto de açúcar, fosfato e uma base, A, T, C, ou G. (Cortesia de Wiley & Sons, Inc.)
Delicada complexidade é envolvida
Cada organismo contém no seu genoma não uns poucos genes, mas na maioria dos casos milhares ou milhões. No corpo humano há cerca de 10 trilhões de células, cada célula contendo normalmente 46 cromossomos no seu núcleo. No conjunto de cromossomos de cada célula há talvez 3 milhões de genes compostos de pares de nucleotídeos, na vizinhança de 5 bilhões.
Células de vacas, ratos ou cereais, cada qual tem um número semelhante. Uma única bactéria de Escherichia coli, que tem cerca de 1/2 mícron de largura e 2 mícrons de comprimento, tem um único cromossomo contendo uma só molécula de DNA. A molécula de DNA esticada teria cerca de um milímetro de comprimento (ou cerca de 500 vezes o comprimento da célula da Escherichia Coli).
Cada uma dessas moléculas de DNA contém cerca de 10 milhões de pares de nucleotídeos, os quais constituem os milhares de genes que dão ao organismo as suas características estruturais e funcionais. Deveria ser ressaltado que nem todos os genes operam no mesmo instante, mas que cada um funciona em instantes apropriados durante a história da vida do organismo. As proteínas denominadas histonas parecem ter um papel importante na regulação da ação do gene.
Aponta toda essa delicada complexidade, com a coordenação da necessária operação, para um Criador e mantenedor sobrenatural? Aqueles que aceitam o argumento de que a existência de um projeto implica num projetista, dizem que sim. Outros dizem crer que a vida criou-se por si mesma, mantendo-se também por si mesma.
Ambas as atitudes baseiam-se nas idéias filosóficas do indivíduo, as quais não admitem prova rigorosa. Mencionaremos mais a respeito disso posteriormente.
Comparação entre o DNA e o RNA
Na maioria dos organismos, o DNA é uma estrutura helicoidal bi-filamentada, encontrando-se, entretanto, considerável variação entre os vírus. Os vírus com DNA mais bem conhecidos, como do sarampo, polioma, T2 , T4 e T6 apresentam DNA bi-filamentado. Diversos grupos de vírus apresentam o seu DNA na forma de um único filamento. Dentre os vírus a RNA, os da gripe, poliomielite e F2 possuem um único filamento, enquanto que nos vírus Reo o RNA tem sido encontrado na forma helicoidal dupla.
Mesmo que a informação genética seja conduzida normalmente por uma única seqüência de nucleotídeos, ao invés de o ser pela seqüência dupla, no instante apropriado pode ser produzida a faixa réplica complementar. Parece, portanto, que o fato importante é estar presente algum tipo de nucleotídeo, seja o RNA, seja o DNA.
A estrutura do RNA é similar à do DNA, dela diferindo porque (a) normalmente possui a base uracila em vez de tiamina; (b) apresenta um átomo extra de Oxigênio em cada parte de açúcar; e (c) usualmente é unifilamentada (enquanto que o DNA é usualmente bi-filamentado).
Está ainda em aberto a questão de ser ou não necessário ácido nucleico (DNA ou RNA) em todos os tipos de atividade reprodutiva associada com os seres vivos, pois há evidências que sugerem que certas condições de enfermidade podem ser devidas a algum tipo de agente transmissor “subviral”, capaz de reproduzir-se. Certa doença do sistema nervoso pode ser causada por tal agente.
Vírus circulares
A recente pesquisa de Goulian, Kornberg e Sinsheimer envolve um dos menores vírus, o chamado ØX174, que consiste de um filamento único de DNA de forma circular.
A evidência original, obtida mediante o microscópio eletrônico, foi interpretada como significando que as moléculas de DNA eram lineares, com duas extremidades livres. Verifica-se agora que algumas moléculas de DNA podem existir na forma linear ou na forma circular. O vírus de polioma contém DNA circular duplo, enquanto que o ØX174 tem um filamento circular único, que permanece circular durante o tempo em que é formado o segundo filamento complementar.
Os círculos de DNA não se limitam somente aos vírus como julgado anteriormente, pois mesmo a molécula de DNA da Escherichia coli tem sido achada em círculo. Foi sugerido que a condição circular poderia desempenhar uma parte importante na reprodução.
Para compreender o significado da pesquisa da equipe de Kornberg com relação à vida em geral, e em particular a criação da vida “in vitro”, é necessário compreender os processos reprodutivos, especialmente do material por eles utilizado.
Reprodução nas formas complexas
A maior parte das plantas e dos animais com os quais estamos acostumados, iniciam-se como uma célula única que se divide e distribui o seu DNA igualmente para todas as células filhas. A quantidade de DNA nas células sexuais (espermatozóide e óvulo) seria a metade da quantidade nas células somáticas. Isso é verdade para organismos tais como pássaros, anfíbios, répteis, mamíferos e insetos.
Ao falar da criação da vida em tubo de ensaio, os cientistas usualmente não estão pensando em algo tão estruturalmente complexo como aqueles organismos. É possível, entretanto, fazer crescer ovos de pássaros num incubador de vidro, ovos de sapos num prato de vidro, e moscas de fruta numa garrafa. Para fazer isso é necessário produzir um ambiente no qual o DNA possa manifestar a sua potencialidade.
A criação de uma simples e minúscula mosca de fruta, com as suas asas, olhos, patas, trato digestivo, sistema nervoso, sistema reprodutivo, sistema muscular, etc., exige o alinhamento adequado de cerca de dez milhões de pares de nucleotídeos no DNA. De fato, nem todas as formas de vida são assim tão complexas, mas mesmo assim, até o presente, as tentativas de “criar a vida” de qualquer espécie têm-se limitado ao estabelecimento de condições adequadas para que os nucleotídeos de DNA pudessem manifestar a sua potencialidade.
Consideração das bactérias e dos vírus
Ao considerar as bactérias, encontramos um grupo que em grande parte é invisível sem dispositivos ampliadores. A Escherichia coli é um bom exemplo. Seriam necessárias cerca de 10.000 delas juntas em um plano para formar uma mancha de dimensões suficientes para atingir o limite de visibilidade do olho nu.
As bactérias reproduzem-se assexuadamente. Quando as condições são adequadas à sua multiplicação, cada célula se divide para formar duas células. Aqui novamente o ácido nucleico distribui-se igualmente nas células resultantes, de tal maneira que cada uma delas tenha o mesmo material genético. Como resultado, todas as células assim produzidas manifestarão idêntico fenótipo, sendo iguais e agindo da mesma maneira que as outras da sua espécie.
Ao se considerarem os vírus, fica-se em dúvida a respeito de serem eles realmente vivos, pois uma das características da vida envolve a capacidade de reprodução. Não se conhecem vírus que vivam fora de células vivas, exceto no sentido de sobreviverem à passagem de célula a célula, pois a sua atividade se desenvolve somente no interior das células.
Foi sugerido que os vírus, que são estruturas relativamente simples, constituem um elo de ligação entre as substâncias com vida e sem vida. Isso não parece razoável, porque falta ao vírus a capacidade de reprodução. Fora da célula viva é ele submetido a forças que em seguida o destruirão. Dentro da célula parece que a sua única função é prover informação necessária para a sua própria multiplicação, às custas da célula.
Desta maneira um vírus pode representar o que anteriormente tenha sido um constituinte celular normal. Possivelmente em resultado de alguma alteração tenha ele “escapado” do controle da célula, embora ainda necessitando da célula para reprodução. Seja ou não isso assim, não parece provável que os vírus existissem anteriormente às células, pois eles necessitam das células para a sua perpetuação.
Variação, reprodução dos vírus
Os vírus apresentam grande variação de dimensões e complexidade estrutural. O maior vírus aproxima-se do tamanho das menores bactérias. Todos os vírus diferem das células por conterem somente ou DNA ou RNA, enquanto que todas as células contêm simultaneamente DNA e RNA como mencionado anteriormente. O ácido nucleico dos vírus localiza-se no centro, sendo revestido por uma capa de proteína.
Para reproduzir-se, o vírus deve transferir pelo menos o seu ácido nucleico para a célula hospedeira apropriada. Se o núcleo for DNA, então o DNA servirá como gabarito para o RNA, que trabalha com o mecanismo celular (ribossomas e enzimas) para a produção das proteínas do vírus. O DNA também servirá como gabarito para a sua própria multiplicação.
Se o núcleo do vírus for RNA, ele agirá diretamente produzindo as proteínas do vírus e multiplicando o RNA. Em ambos os casos, serão produzidos tanto o material do núcleo, com o seu ácido nucleico específico, como a correspondente envoltória proteica do vírus, os quais se unirão em seguida para formar partículas de vírus desenvolvidas que escaparão da célula e atacarão mais células.
Em adição à produção de ácido nucleico e da envoltória proteica, freqüentemente serão também formadas uma ou mais enzimas. De uma maneira ou de outra, serão elas necessárias para ser bem sucedida a multiplicação dos vírus. Por exemplo, se a célula tiver uma espessa membrana, os vírus poderiam ficar aprisionados. Entretanto, muitos vírus tem um código genético para uma enzima destrutora das paredes celulares, a qual faz com que a célula da bactéria se desintegre no momento oportuno.
Ciclo vital de um vírus
Antes de considerar com algum detalhe o relatório de Goulian, Kornberg e Sinsheimer, seria prudente discutir o ciclo de vida normal no vírus por eles usado, a saber, o ØX174 (Ver Figura 2). A notação Ø indica que o vírus é fagócito ou bacteriófago (fago significa comer ou consumir). Os fagócitos destroem bactérias.
O fagócito ØX174 é um dos menores vírus e tem um peso molecular de somente seis milhões, da mesma ordem de algumas moléculas de proteína bastante grandes. O núcleo do vírus consiste de um filamento único de DNA composto de 5500 resíduos de nucleotídeos. Isso corresponde a 5 ou 6 genes. Envolvendo esse núcleo de DNA há uma capa de moléculas de proteína.
O vírus é absorvido pela parede celular de uma bactéria Escherichia coli. O DNA, que é chamado de filamento (+), é injetado, e a capa proteica permanece fora da célula da bactéria. Depois que o filamento (+) de DNA entra na célula, forma-se um filamento (-) complementar, produzindo-se assim uma hélice com duplo filamento. Esse DNA bi-filamentar é chamado de forma replicativa (RF).
A própria forma replicativa duplica-se, formando novas RF. Dá-se também a formação de réplicas de moléculas específicas de RNA do ØX174, sobre as moléculas das RF.
Dá-se então a formação de réplicas de filamentos (+) sobre os filamentos (-) das RF. Simultaneamente, são produzidas moléculas da capa proteica. As moléculas da capa proteica agregam-se então em torno dos filamentos (+), formando-se assim partículas “amadurecidas” de vírus.
A parede celular da bactéria rompe-se e diversas centenas de novas partículas de vírus são liberadas. Cada uma das novas partículas, por sua vez, pode infetar uma célula de Escherichia coli, obrigando-a a produzir mais DNA e mais proteína de vírus, para depois liberar mais diversas centenas de vírus, dando assim seqüência ao processo.
MW é o peso molecular de uma única partícula ou molécula, tomando-se como referência o
peso do átomo de Hidrogênio aproximadamente igual à unidade (de Watson).
As experiências duplicam a atividade dos vírus
As experiências recentes foram estabelecidas para repetir no exterior da célula o que normalmente acontece em seu interior. Nos preparativos iniciais, os pesquisadores trataram os vírus intactos com fenol, para remover as capas protéicas, deixando assim o DNA puro, que serviria como filamento (+), ou círculos (+).
Foram obtidas da Escherichia coli, e purificadas, a polimerase do DNA e a enzima aglutinadora dos polinucleotídeos. Outras células de Escherichia coli foram rompidas (por um método sônico), o fluido foi centrifugado e o sobrenadante foi fervido. Essa solução sobrenadante, portanto, continha os materiais solúveis termoestáveis obtidos da célula das bactérias.
A mistura de incubação na qual ocorreu a primeira reprodução do DNA, era composta do seguinte: DNA de ØX, quatro precursores de nucleotídeos (trifosfatos de desoxinucleosídeo, obtidos de uma fonte externa), polimerase de DNA, enzima aglutinante, DPN (portador de Hidrogênio), extrato fervido de Escherichia coli, cloreto de magnésio, tampão de fosfato de potássio, mercaptoetanol, e albumina. O tempo de incubação foi de 180 minutos a 25°C.
Durante a incubação, os círculos (+) naturais de DNA do ØX serviram como gabarito para a formação das cadeias (-) complementares, e a polimerase do DNA catalisou a polimerização da cadeia (-). À medida em que os precursores de nucleotídeos se aglutinavam para se tornarem unidades na nova cadeia de polinucleotídeos (-), sofriam certas alterações, inclusive a perda de alguns grupos fosfóricos. A enzima aglutinante catalisava a junção das extremidades opostas da nova cadeia (-) de DNA, de tal modo que se completava um circulo duplo (RF) (Figuras 3 e 4). Esses círculos eram semelhantes ao RF isolado das células infetadas de Escherichia coli, embora o RF parcialmente sintetizado não apresentasse a forma bastante espiralada encontrada no RF natural.
Produção dos círculos duplos de DNA
Os novos círculos duplos foram expostos a uma diástase pancreática DN que rompeu um deles, levando-os a separar-se. Os filamentos (-) sintéticos puderam ser separados dos filamentos (+), porque na mistura de incubação a timina tinha sido substituída pela bromouracila não natural, mas biologicamente ativa e mais pesada.
Quando o material foi centrifugado, os filamentos (-), contendo bromouracila, puderam ser separados devido à sua maior densidade. Foi demonstrado por ensaios radioativos que os novos filamentos (-) não foram contaminados por filamentos (+) do gabarito. O material (+) do gabarito tinha sido preparado com Hidrogênio radioativo (Trítio, H3) e os precursores do nucleotídeo usados para a síntese dos novos filamentos (-) continham Fósforo radioativo.
Os novos círculos (-) infetaram as células de Escherichia coli. Isso teve de ser feito usando Escherichia coli especialmente preparada, pois o DNA, sem a costumeira capa protéica, era incapaz de penetrar nas células normais das bactérias. As Escherichia coli especialmente preparadas estavam sem as suas paredes celulares, de modo que, assim alteradas, o DNA podia penetrar. Sob as condições de laboratório mantidas nessa pesquisa, as células das bactérias sem as suas paredes são de forma globular, e conhecidas como esferoplastos. Os círculos (-) de DNA recém formados infetaram os esferoplastos e produziram novos vírus intatos.
Os círculos de DNA infetam as bactérias
Os pesquisadores também produziram círculos duplos completamente sintéticos, preparando uma mistura de incubação análoga à previamente utilizada. Quando os círculos positivos eram separados, podiam atuar como gabaritos, dando origem à formação de RF dentro dos esferoplastos de Escherichia coli. Dessa maneira, os pesquisadores puderam realizar in vitro a produção tanto dos círculos (-) infecionantes, como dos (+) (Figura 5).
Essas experiências demonstraram o que deveria ocorrer dentro das células de Escherichia coli após a invasão do DNA do vírus ØX174. Os pesquisadores afirmam que parece provável que as mesmas enzimas utilizadas em suas experiências são as que as células infetadas de Escherichia Coli utilizam para conseguir a polimerização do DNA e a junção das extremidades dos filamentos do DNA. As enzimas utilizadas por eles foram extraídas de bactérias Escherichia coli, e o ambiente experimental, consistindo de extrato fervido de Escherichia coli, etc., aproximava-se bastante das condições existentes no interior das células de Escherichia coli.
Tanto os círculos sintéticos de gabarito (-) como os círculos sintéticos (+) infetariam as células das bactérias, obrigando-as a produzir os filamentos complementares adequados, bem como a proteína envolvente do vírus. Ambos os círculos duplos são considerados formas replicativas (RF). As letras A, C, G, BU e T, indicam os precursores nucleotídeos contendo respectivamente adenina, citosina, guanina, bromouracila, e timina (Goulian, Kornberg e Sinsheimer).
Interpretação e avaliação da pesquisa
Referir-se ao desenvolvimento dessa recente pesquisa como “produção da vida em um tubo de ensaio” não deixa de ser claramente uma dramatização da história. Os cientistas reconhecem o fato não como a criação de um organismo vivo, mas sim como a habilitação de um gabarito de DNA para realizar uma cópia de si mesmo em um “tubo de ensaio”, mediante um processo reprodutivo que normalmente ocorre tão somente dentro das células das bactérias.
Entretanto, esse trabalho constitui provavelmente a realização mais próxima daquilo que a maioria de nós pensa ao dizer “vida em um tubo de ensaio”. A pesquisa constitui um importante passo no sentido de nossa compreensão e controle da vida, e poderá conduzir a um melhor tratamento de várias doenças, inclusive o câncer, bem como poderá levar ao controle de algumas condições hereditárias.
Provavelmente não será prudente condenar os pesquisadores envolvidos nesse recente projeto como procuradores de fama. Embora a sua pesquisa possa ter sido relatada em termos extravagantes, as pessoas em si são pesquisadores conscienciosos. Pode assim ser justificada a sua utilização dos meios populares de divulgação, ao invés de somente a literatura técnica (nesse caso o número de dezembro de 1967 dos Proceedings of the National Academy of Sciences of the USA).
As verbas governamentais canalizadas pelas fundações nacionais de auxílio para as pesquisas de Kornberg atingiram, nos últimos sete anos, cerca de dois milhões de dólares. Sendo elas fundos públicos, o contribuinte que compreender o que está sendo feito estará mais disposto a ver o seu dinheiro utilizado no apoio de tais pesquisas básicas. Por isso Kornberg decidiu que a causa da ciência lucraria com a publicidade geral. Disse ele:
Achei que este trabalho poderia ser mais facilmente interpretado para o público do que outros que temos feito. Percebi posteriormente a necessidade de a ciência ser melhor compreendida pelo público, e tive a impressão de que nem sempre temos explorado nossas oportunidades de obtenção de auxílio público.
Precauções da maior parte dos investigadores
A maior parte dos investigadores que lidam com fenômenos associados aos seres vivos, compreende a complexidade da vida, bem como a pequena parte que realmente eles estão representando, ao esclarecer alguns detalhes mecanicistas a respeito de como a vida se mantém. Estamos aumentando rapidamente nosso conhecimento da estrutura e da função do DNA na sua própria reprodução e na produção do RNA e das proteínas necessárias à vida. Entretanto, deveria ser ressaltado que todos os seres vivos, inclusive a minúscula ameba, possuem centenas e milhares de enzimas, e nem mesmo são conhecidos à estrutura e o arranjo espacial dessas proteínas.
Conhecemos as seqüências dos aminoácidos de umas poucas proteínas – os quais são membros de provavelmente menos do que trinta famílias de proteínas. Não podemos mesmo nem sequer ler as seqüências dos nucleotídeos das moléculas de DNA. Poucas substâncias relativamente simples têm sido sintetizadas sob condições de laboratório, como por exemplo aminoácidos, polipeptídeos (ou cadeias de aminoácidos), açúcares, nucleotídeos e ATP (tri-fosfato de adenosina, que é utilizado nas transformações produtoras de energia), e mediante o uso de técnicas especiais mesmo a insulina, que é uma proteína de pequenas dimensões.
Ao compararmos essas substâncias com os seres vivos, tornam-se elas umas poucas peças sobressalentes em relação a uma gigantesca máquina. É importante ressaltar que, devido à complexidade da vida, a produção de um organismo auto-reprodutor a partir de simples precursores não parece estar ao alcance dos cientistas atualmente. Esse fato deveria não só desafiar como também encorajar um otimismo cauteloso entre os que militam na pesquisa biológica básica.
Fé em Deus pela consideração do DNA
Alguns cientistas tentaram usar o recente conhecimento do DNA, do RNA, e de vários fenômenos vitais, para desacreditar a fé em um Ser sobrenatural. Freqüentemente o “deus” de tais indivíduos se torna a busca da verdade. Para alguns a ciência tornou-se uma religião que ensina os homens a adorarem os produtos da mente humana.
Por outro lado, há outros cientistas, inclusive eu mesmo, que têm percebido que há uma dimensão espiritual além dos milimícrons e centímetros cúbicos utilizados nas pesquisas de DNA e de proteínas. Um dia, há alguns anos, quando eu estava ainda na Universidade, um de meus companheiros contou-me em termos inesquecíveis o que lhe tinha acontecido à meia noite do dia anterior. Disse ele ter sentido repentinamente como se tivesse atingido o topo de sua escada materialista. “Deve haver algo além disso” expressou-lhe a sua própria natureza.
Parece-me que a fé em Deus é algo lógico. Há muitos argumentos filosóficos que, verdadeiramente, não provam a Sua existência; apesar disso, quando considerados em conjunto, eles mostram que a fé em um Deus sobrenatural é lógica. Da mesma maneira, tal fé satisfaz.
Falando a respeito de Deus, disse Agostinho – “Tu nos fizeste para Ti, e nossos corações não têm descanso enquanto não o encontrarem em Ti”.
Disse alguém que Deus criou o homem com um lugar vazio que somente Ele poderia preencher. Para mim é significativo que a crença em um Ser sobrenatural é encontrada universalmente em todas as culturas, e tanto quanto saibamos sempre tem sido assim.
Indicada a relevância da Bíblia
A Bíblia indica que as coisas invisíveis, desde o princípio do mundo, são reconhecidas e percebidas por meio das coisas que foram criadas, e essas apontam para o poder de Deus e Sua própria divindade (Romanos 1:20). Conta-se que, durante a Revolução Francesa, quando alguns homens se determinaram a remover igrejas, sacerdotes, Bíblias, e tudo o que fizesse o povo lembrar-se de Deus, um camponês sorriu ao lhe dizerem isso. Ao lhe perguntarem por que sorria, o camponês apontou para as estrelas, acima, e disse: “Eu estava só imaginando como vocês as tirariam lá de cima”. O Salmo 19 versículo 1 nos diz que “os céus declaram a glória de Deus”.
A Bíblia indica que Jesus Cristo realmente é o Criador mencionado em Gênesis capítulo 1, verso 1 (Ver Evangelho de São João, capítulo 1, versos 1 e 14; Epístola aos Hebreus, capítulo 1, verso 2; Epístola aos Colossenses, capítulo 1, verso 16), e diz na Epístola aos Colossenses, capítulo 1, verso 17, que em Cristo tudo subsiste. Eu acho que isso pode referir-se à essência da vida. Os modernos estudos físico-químicos deram-nos considerável conhecimento das forças de atração existentes entre as moléculas, e dos laços que mantêm unidas as moléculas. Agradeço a Deus por esse conhecimento, porque com ele podemos compreender melhor a Sua criação.
Olhando aos “diamantes” estrelados reluzindo à noite no céu, há algo que nos força a meditar na grandeza do Deus que os criou; entretanto, há algo no DNA e em sua operação que igualmente me impressiona. Há aqui evidência do trabalho das mãos de um Deus familiarizado com a complexidade.
A maior complexidade de que temos conhecimento atualmente existe no “protoplasma” vivo. Parece-me, a mim, que o cérebro humano (provavelmente o órgão mais complexo existente), levar-nos-ia pelo menos a suspeitar da existência de um Poder Superior.
Aqueles de nós que já experimentaram em suas vidas esse Poder Superior, na pessoa de Jesus Cristo, têm pelo que ser agradecidos. Temos participado em várias fases de pesquisas científicas e agradecemos a Deus por todo o novo conhecimento que Ele nos permite obter. Ao analisar os componentes dos seres vivos, e ao sintetizar alguns deles, estamos aprendendo mais da Sua atividade criadora.
Jamais será possível – partindo de simples substâncias químicas – compor algo vivo, fazê-lo manter-se a si mesmo, e reproduzir-se, em um tubo de ensaio (ou fora de um tubo de ensaio)? Esta pergunta permanece sem resposta. De qualquer maneira, tanto quanto Deus permita, continuaremos pesquisando e aprendendo mais acerca do DNA e outros aspectos da Sua criação.
Bibliografia
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(3) Greenberg, D. S. 1967. The synthesis of DNA: how they spread the good news, Science, 158:1548-1550.
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(5) Watson, J. D. 1965. Molecular biology of the gene. W. A. Benjamin, New York. 494 p.
PROBABILIDADE E EVOLUÇÃO
(Esta Nota foi acrescentada à primeira edição deste número da Folha Criacionista)
Nesta reedição do número 4 da Folha Criacionista desejamos divulgar aqui a lista dos artigos que foram publicados até o nosso número 59 versando sobre a aplicação da Teoria das Probabilidades à análise de vários aspectos envolvidos em uma evolução ao acaso. Os números das Folhas Criacionistas em que foram publicados os artigos são indicados em negrito, bem como o seu número de páginas, entre parênteses.
4(21-30) – Uniformismo, Probabilidade e Evolução – A. J. (Mounty) White
11(43-55) – Argumentos contra a origem aleatória da simetria e do planejamento ou projeto – Howard Byington Hobroyd
12(5-20) – Termodinâmica: Uma ferramenta para os criacionistas – Emmett L. Williams
12(21-24) – É possível a evolução das proteínas – M. Trop e A. Shaki
13(5-7) – Os macacos datilógrafos – A. J. (Mounty) White
14(31-47) – O Darwinismo é descabido física e matematicamente – Howard Byington Hobroyd
16(13-35) – A macroevolução questionada – Roger W. Haines Jr.
19(47-62) – Interdependência na síntese das macromoléculas – evidência de planejamento – Douglas B. Sharp
20(41-55) – Restrições às transformações inerentes aos seres vivos – D. R. Boylan
21(25-50) – Dezessete problemas para os evolucionistas – Art F. Poettcker
21(51-56) – A Missão Apolo-16 e a evolução bioquímica – G. T. Javor e G. E. Snow
25(5-56) – Um ponto de vista consistente cristão e científico a respeito da origem da vida – Duane T. Gish
38(50-55) -Considerações de Fred Hoyle sobre as teorias da origem do Universo – Notícia
38(55-56) – Hoyle e a evolução – Notícia
39(26-37) – O princípio e o planejamento do Universo – Russel T. Arndt
50(17-27) – Dos átomos ao primeiro ser vivo – Domenico Ravalico
58(8) – O Relojoeiro Cego – Notícia
59(4ª capa) – Moléculas enantiomorfas – Notícia