A revista Scientific American – Brasil nº 25, ano 3, de junho de 2004, trouxe um interessante artigo com o título “O Enigma sobre o Início do Tempo”, de autoria de Gabriele Veneziano, físico teórico do CERN – Centro Europeu de Pesquisas Nucleares. É interessante notar como paradigmas estabelecidos no seio do “establishment” científico aparentemente bastante solidamente podem ser ameaçados seriamente com o avanço dos conhecimentos. Fatos como este apenas fortalecem a posição de Thomas Kuhn apresentada em seu famoso livro “A Estrutura das Revoluções Científicas”, relativamente ao declínio e queda de paradigmas científicos (diríamos com mais propriedade: paradigmas filosóficos sobre os quais repousa a estrutura da ciência) e confirmam que a construção do conhecimento científico é um processo contínuo em busca da verdade. O que hoje é considerado “certeza científica” amanhã poderá ser considerado inteiramente ultrapassado, como aconteceu com o flogístico, o calórico, o éter, etc.

Transcrevemos, a seguir, alguns trechos do referido artigo, para que nossos leitores possam sentir o que realmente está em jogo atualmente nessa área do conhecimento humano.

Será que o tempo realmente começou com o Big Bang? Ou será que o Universo já existia antes dele? Uma pergunta como essa era quase uma blasfêmia há apenas uma década. Muitos cosmólogos insistiam que ela simplesmente não fazia sentido – que observar um tempo anterior ao Big Bang era como pedir informaçoes sobre um lugar ao norte do pólo norte. Mas os desenvolvimentos da física teórica, particularmente a ascenção da teoria das cordas, mudaram essa perspectiva. O Universo pré-Big Bang tornou-se a última fronteira da cosmologia.

… Os gregos antigos discutiam calorosamente a origem do tempo. Aristóteles, partidário do tempo sem início (eterno), invocava o princípio de que do nada, nada vem. Se o Universo não poderia nunca ter passado do não ser para o ser, deveria ter existido sempre. Por essa e outras razões, o tempo deve se expandir eternamente pelo passado e pelo futuro.

Os teólogos cristãos costumavam adotar ponto de vista contrário. Santo Agostinho defendia a existência de Deus fora do espaço e do tempo, capaz de dar vida a esses construtos da mesma forma como podia forjar outros aspectos de nosso mundo. Quando lhe perguntaram “O que Deus estava fazendo antes de criar o Universo?”, Santo Agostinho respondeu: “Como o próprio tempo faz parte da criação de Deus, simplesmente não existia antes”.

Essas duas concepções extremas relativas à existência do Universo no decorrer do tempo acabaram tendo sua contrapartida nos tempos modernos nas diferentes teorias, formuladas com grande grau de sofisticação, utilizando ferramentas matemáticas complexas, que em síntese ou admitem um início pontual para o Universo, simultaneamente em termos de espaço e de tempo – o Big Bang – ou então admitem a possibilidade de existência de um “pré-Universo”, do qual se tenha originado, de alguma maneira, o atual Universo que podemos observar.

O artigo em questão aprofunda-se em considerações específicas sobre os dois diferentes modelos, apresentando ilustrações interessantes visando explicar os respectivos pontos de vista distintos. De tudo que é apresentado conclui-se, certamente, que o paradigma do Big Bang encontra-se de fato seriamente ameaçado em resultado das propriedades matemáticas derivadas da teoria das cordas quânticas aplicada à cosmologia.

Talvez a ilustração mais impressionante da diferença entre as duas concepções que se defrontam seja a que reproduzimos neste apanhado, com as respectivas legendas originais publicadas no artigo. Em linguagem mais simples e objetiva, dentro do panorama geral da controvérsia entre evolução e criação, verifica-se, a partir dessas ilustrações, que a nova teoria põe por terra a “árvore evolutiva das galáxias” que supunha a sua origem a partir de um ponto no qual se concentrariam toda a matéria e toda a energia primordiais.

A situação de um Universo originado pelo Big Bang é similar, mutatis mutandis, à complexidade da “explosão cambriana” originada a partir da fauna e flora pré-cambrianas – como explicar por evolução ambos os processos? As evidências realmente favorecem não uma “árvore”, mas um conjunto de troncos paralelos correspondentes a tipos pré-determinados existentes desde o início de uma criação especial.

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